sexta-feira, 18 de maio de 2007

Fofoletes Assassinas



Eu colecionava fofoletes
vinham em caixas como fósforos
um dia, esfreguei aquele gorrinho
com o pomponzinho
do lado da linda caixinha
fofolete pegou fogo
eu joguei numa valeta,
o esgoto ignorou

Rio de Janeiro incendiou
fofoletes, quem diria
pequenas assassinas
com pompons tão delicados
mataram todos cariocas
fizeram dos milhos, pipocas
da minha infância; paçoca
fofoletes são culpadas
desta vida adulterada
desse peixe sanguinário
desse marte em sagitário...

quarta-feira, 16 de maio de 2007

A Lenda do Amor do Mar



Quando uma jovem dormia na beira de um rio,
Acordou com o som de um galope
Um galope de um ciclope que passou por ela e nem viu
Esmagou sua cabeça na beira do rio.
O caldo de seu cérebro se misturou com as águas azuis,
Um único neurônio se salvou e como um pequeno girino nadou.
Chegou no oceano já como uma serpente azul,
Netuno ao ouvir a notícia ordenou que a trouxessem.
Nenhum tritão foi capaz de tal proeza, a serpente era invencível.
E ao perceber-se perseguida, gritou aos sete mares:
-Não temam, sou invencível porém não lhes quero mal.
Netuno não contente bramiu:
-E quem pariu um monstro assim tão virtuoso?
-A Pata de um ciclope foi meu pai, minha mãe uma mulher que sonhava, eu sou o sonho,
que sobreviveu.
-Com que sonhava sua falecida mãe?
-Sonhava que encontrava um grande amor entre as águas do oceano...

Assim, a serpente azul, nadou por todo mar, e por onde passou, espalhou o amor que sua mãe sonhou...



terça-feira, 15 de maio de 2007

Fragmentos Da Menina da Lancheirinha


Óleo (A Noite)

Óleo é uma cidade muito pequena do interior de São Paulo, ali, perto de Avaré.

Fiquei muito feliz quando vi que o Óleo, estava no mapa do Estado. Eu sempre amei e ainda amo viajar pelos mapas.
Ali nasceu minha mãe, foi em uma fazenda das redondezas que minha avó foi criada, foi no Óleo que depois de Casados meus avós foram morar. Ali nasceram todos os filhos.

“ Avó usa grampo.
Avô usa chapéu.
Avós voltam pro grampo.
O feminino é sempre plural.”

A casa do Óleo, ficava na rua principal, ao lado da antiga “venda” da minha vó, nessa época apenas um enorme galpão fechado com prateleiras velhas e alguns objetos esquecidos que eu gostava de descobrir.


Eu não entrava ali sempre, era escuro e as paredes que falavam comigo choravam muitas lembranças, eram poucos momentos com cheiro de mofo e esquecimento..
A venda tinha uma pequena porta “nessa época sempre trancada” que dava exatamente na sala da casa que posso
chamar de “coração”.

(Amor, aquela casa foi e ainda é , embora tenha sido vendida, embora nem saiba se ainda está de pé o coração da minha
infância.)

Não tinha quintal na frente, só uma enorme varanda com cadeiras de madeira onde minha vó passava horas conversando com suas velhas e inseparáveis amigas, Dona Luzia e Dona Maria, que sempre choravam quando íamos embora.


Ainda vejo a cena de dentro do carro partindo. Olhava pela “janela de dar tchau” e via as duas velhinhas em pé acenando e chorando. Enquanto iam diminuindo, sentia a pele quente da minha vó, ao meu lado, mas não olhava pra ela, não queria ver suas lágrimas.

A varanda tanto levava para a sala enorme quanto ao jardim lateral onde minha vó cuidava de suas roseiras, havia muitas rosas, outras flores também, mas só lembro das rosas, minha vó cuidava mais das rosas, e eu só cuidei de lembrar delas..

Fragmentos da Menininha da Lancheirinha


O Zé Catraca



Foi também no quintal que presenciei outra cena terrível.
Dessa vez eu estava só, estava no quintal de cima, um quintal acima do pomar, que ficava do outro lado do “jardim das rosas”

Nessa época Amor, na casinha branca do pomar, morava um casal de caseiros, eram velhos, mal os via, depois percebi que não eram de fato caseiros, moravam ali numa casa minúscula por caridade da minha vó.

Esse casal tinha um filho conhecido como “Zé Catraca” . Eu tinha muito medo dele; tinha um rosto cavernoso e parecia um personagem de algum filme de David Linch, aqueles do mal.

Sua pele era de um tom cinza-esverdeado, tinha um cabelo sempre oleoso e cheirava mal,

sei que andava pelas ruas e que não trabalhava, quando não estava bêbado, também estava, acho que nunca ouvi sua voz, só via seus vultos sempre escuros vagando pelo pomar.

Na casinha minúscula que os velhinhos moravam não tinha lugar para ele, então minha vó o acomodou numa espécie de porão, que na verdade estava abaixo da casa e só tinha uma entrada pelo quintal.

Era uma espécie de caverna, tinha uma entrada, mas não tinha porta. Nesse lugar, pensava que além daquele homem, também moravam outros monstros, eu olhava para o buraco e sempre tentava me desviar, mas claro que eu ansiava o momento de entrar e ver o que havia de fato por lá.

A sintonia, que agora entendo é que a cena terrível se deu no mesmo dia que entrei pela primeira vez naquela caverna assombrada.
Resolvi entrar e levei comigo a sensação de "euforia que o medo traz” estava em pânico e apaixonada pelo instante.

Sorrateira e sozinha, cuidei para que o homem cinza-esverdeado não estivesse por perto e fui...
Era escuro, não tão grande, olhei tudo em um segundo, vi um colchão listrado, um “trabissero” sem fronha, umas garrafas vazias (de pinga certamente) e roupas jogadas por todo lugar, um instante de divagação passou por mim...
”Como alguém podia viver assim?” “A mãe não cuidava dele?” “Porquê será que ele era assim?”

Saí sem ver monstro algum. Os monstros sei agora que estavam dentro de mim, aquele buraco era apenas um botão que acionava essa sensação. Mas naquela época minha fantasia não me deixava questionar a existência dessas e outras criaturas

Foi logo depois que aconteceu...

Entrando ali e profanando o habitat do monstro real , achei que de alguma forma o chamei.
E assim, no quintal de cima, onde estava perdida em meus questionamentos , foi que ele apareceu, em carne e osso, o “Zé Catraca”.

Apareceu por trás de mim, pensei que fosse me pegar, mas não. De repente olhei pra ele e vi que estava tremendo, tremendo mais e mais, até que caiu no chão, onde continuou e se contorcer, emitia sons guturais, seus olhos giravam sem destino, eu fiquei congelada, acompanhando a cena, quadro a quadro:

Foi o monstro se revelando finalmente, por um minuto pensei que ele estava se transformando, logo me engoliria, esse pensamento me tirou do papel de espectadora e me levou ao de vítima, como vítima, fugi desenfreada, pulei o portão e subi a rua até chegar à casa da prima da minha mãe, onde sabia que todos estavam.

Cheguei e contei, devo ter contado assim:
-Mãe!- o Zé do porão ta lá caído no quintal, ta se revirando, vem depressa ver!
Foram, mas já o tinham socorrido, me explicaram que teve um ataque epilético, eu não sabia o que era isso, mas enfim, não era sobrenatural.


Fiquei de mal com a fantasia. Mas só por alguns dias...