quinta-feira, 31 de maio de 2007

Fragmentos

Primeiro dia de aula- Um ato Fúnebre

Minha avó me acordou mais cedo aquele dia, me deu banho mais bem dado e esfregou meus cabelos com mais força, também me penteou com mais vontade, e esticou mais do que nunca minha testa quando colocou as duas Marias-chiquinhas com enfeites de bolinhas.
Depois trouxe meu uniforme cheirando a roupa muito bem passada e me vestiu cuidadosamente.
Calcinha branca novinha e a saia azul-marinho toda pregueada que descia até meus joelhos, depois a camisa branca de abotoar, com golas engomadas e um símbolo do colégio no bolso que ficava na altura do peito. Colocou as meias
brancas que tinham sulcos entre as tiras planas verticais. Esticou-as até a metade das minhas pernas, até onde era possível esticar. Depois foi até ao armário e pegou as botas pretas ortopédicas que eu precisava usar por ter um pé muito cavo e pequeno. Só as crianças com problemas ortopédicos podiam usar essas botas. As botas estavam brilhando de tão bem
escovadas (apesar de novas). Colocou uma a uma, e amarrou os cadarços (eu não sabia amarrar ainda).
Depois fez um
julgamento final, me olhou de cima a baixo e disse:
-Pronto Lolinha você está pronta!

(Eu não estava...)

Meus pais e meu irmão esperavam embaixo, não houve a famosa foto do primeiro dia que todas as crianças têm (até meu irmão). Não houve indagação alguma, peguei em silêncio o que me disseram pra levar, uma sacola azul-marinho, que para ser diferenciada de todas as outras iguais, deveria ter um bordado especial, minha sacola tinha um ursinho vermelho.
Na sacola havia um calção branco para a hora do recreio, escova e pasta de dentes e uma toalhinha também azul- marinho.

Minha avó colocou no meu ombro a lancheira rosa com um desenho de um trenzinho.
Dentro da lancheira havia uma garrafa com laranjada, um sanduíche recheado de queijo e manteiga e umas barras de chocolate, todos cuidadosamente embrulhados em papel alumínio.

“Minha avó colocou no meu ombro a lancheira rosa com todo peso do mundo.
Dentro da lancheira havia uma garrafa com um fundo de oceano, um sanduíche recheado de medo e umas barras de prisão , todos cuidadosamente embrulhados em papel de escrever adeus.”

Fui...

3 comentários:

Unknown disse...

Eu, hein...q sofrimento! Espero q vc ainda explique o porquê de tanto medo de ir pra escola...

Vivian Guilhem disse...

Meu amor, vc escreve tão bem e tão claro, que chego a te ver pequenininha na minha frente.... E tão assustadinha de dar dó!!!
Amo essa parte do livro!!
Seu livro é demais!!!

Regiane disse...

Helô, com eu entendo o seu primeiro dia de aula... Ainda bem que sempre tem um anjo a nos cercar... No seu caso, a avó. No meu, meu pai...
Beijo!!
Que texto sincero!
Regiane